Epitáfio

Estive pensando na vida agradável das personagens de Os Miseráveis. Certamente, quando Victor Hugo escreveu sua obra jamais conseguiria imaginar que a humanidade pudesse ser muito mais cruel.

É decepcionante, mas nem o inspetor Javert, nem o criminoso Jean Valjean, (que foi condenado há mais de dez anos de prisão por um furto famélico) nem a família trapaceira dos Thénardier, com toda a sua ganância conseguiriam sobreviver a um dia no sistema prisional brasileiro de hoje.

Certo que era mais fácil prender alguém em séculos passado. Cesare Beccaria que o diga. Mas, reflito, mudamos muito? Hoje a justiça é pública, só se pode prender com motivos previstos em lei e manter preso provisoriamente, sem julgamento, apenas com autorização judicial a qual deve estar plenamente amparada na legislação. Mas sabemos que não é assim. Diariamente pessoas são presas por pequenos furtos e esquecidas nas celas. Mesmo aqueles que tiveram julgamento e que já cumpriram, integralmente, sua sentença só saem da cadeia quando se lembram de soltá-los. E muitos acabam mesmo por se conformar, afinal, vão para onde, se não têm ninguém por eles?

Quando Nelson Rodrigues afirmou que “liberdade é melhor do que pão” certamente não falava desses párias, esquecidos por uma sociedade que adora o luxo e simplesmente vira as costas aos nossos miseráveis de hoje, o lixo que, a cada, dia exige um tapete maior para escondê-lo.

Ah, como cansa viver entre os homens. Sempre medindo uns aos outros, sempre esperando uma oportunidade para lucrar seja como for, às custas do primeiro que lhes caírem nas mãos.

Nem por isso, hoje, devo dizer que estou triste. Não estou. Estou com raiva dessa mediocridade que respira ao meu redor.

Também não tenho medo, nunca tive. Não sou, a exemplo de Madelaine de Victor Hugo, uma redenção romanesca demais para ser verossímil. Sou muito mais, Pixote, correndo no campo-santo, com as flores murchas na mão para depositar na sepultura de Estrelado. Aguardando a bala covarde do Galego para, enfim, descansar em paz.

Contudo, se abala não vier, vou-me a ela. Pois, a exemplo de tantos outros, diferente do senhor Washington Luís, eu também “não sou desses que espera o Cardeal.”

Falecido escritor - Cezar Lopes.

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