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Mostrando postagens de novembro, 2010

Epitáfio

Estive pensando na vida agradável das personagens de Os Miseráveis. Certamente, quando Victor Hugo escreveu sua obra jamais conseguiria imaginar que a humanidade pudesse ser muito mais cruel. É decepcionante, mas nem o inspetor Javert, nem o criminoso Jean Valjean, (que foi condenado há mais de dez anos de prisão por um furto famélico) nem a família trapaceira dos Thénardier, com toda a sua ganância conseguiriam sobreviver a um dia no sistema prisional brasileiro de hoje. Certo que era mais fácil prender alguém em séculos passado. Cesare Beccaria que o diga. Mas, reflito, mudamos muito? Hoje a justiça é pública, só se pode prender com motivos previstos em lei e manter preso provisoriamente, sem julgamento, apenas com autorização judicial a qual deve estar plenamente amparada na legislação. Mas sabemos que não é assim. Diariamente pessoas são presas por pequenos furtos e esquecidas nas celas. Mesmo aqueles que tiveram julgamento e que já cumpriram, integralmente, sua sentença só saem

Epifania

Cogito ergo sum. Mas bem que eu poderia não existir. Detenho-me a refletir sobre a existência no dia consagrado aos desencarnados. O mundo segue lânguido e misantrópico lá fora. Os mortos enterram seus mortos e choram a própria finitude que se avizinha. Dentro de mim, avalio a solidão desta frase. Cogito ergo sum. Estou rodeado de pessoas que tentam se definir no tempo e no espaço da própria existência. São cargos, títulos, marcas de automóveis, cores odores, amores, paixões, enfim, signos. Sinais que emitem para que possam se localizar reciprocamente, na escuridão que os envolve, certos de que estão cegos de tanta luz. Quanto a mim, me canso facilmente desse jogo. Acabo por desrespeitar as regras e rasgar cenários erigidos por zelosos cenógrafos acéfalos. Mas, com o tempo aprendi a deixar que as crianças se divirtam enquanto podem. Sem lhes tirar o prazer da ilusão, também não sou obrigado a resgatar-lhes quando se dão conta da ficção, embora isso raramente aconteça e as pessoas t

"Canalha, você é um verdadeiro canalha"

Logo ali, meu filho, na esquina do mundo, morreu o mais competente canalha de quem já se teve notícia. Indômito, erigiu castelos de palavras. Com elas dispôs e obteve tudo o que sempre quis. O mundo estava aos seus pés. Senhor das idéias, suas construções, qual fogo-fátuo, bruxuleavam viçosas à distância. Mas aqueles que se aproximaram garantem, apenas a inexistência, o não-ser, esteve realmente, sempre, lá. Então, quando se fartou, entediado, deu as costas ao mundo e partiu, sem explicações ou motivos. Simplesmente partiu, e nunca mais voltou. De fato, só sabemos que morreu, por que conhecemos quem o matou. O tédio. Tédio da vida, do conhecimento vasto e improdutivo que assola as mentes dos verdadeiros canalhas. Eu disse canalha? Desculpe. Quis dizer, intelectual. Falecido escritor - Cezar Lopes.