O sr. Ninguém

Ventava forte naquele dia. Ele sempre fazia coisas estúpidas quando ventava. Dessa vez, estava decidido. Abandonaria aquele casamento de aparências. Nunca mais teria de bajular aquele bando de vaidosos por... Pelo quê mesmo? Por sua cordial benevolência, oferecendo-lhe generosamente o prazer de sua companhia? Permitindo-lhe, por sua superioridade evidente, que ele lhes servisse da forma mais humilhante possível, sempre com um sorriso de quem pede desculpas por existir. Era o tempo. Seria assim. Iria em busca da sua própria identidade.

Raios e trovões avolumaram-se naquela noite. Os conselhos eram os mais diversos. Fica! Vai mesmo! Vai logo! Não faça isso! Já devia ter feito! A noite foi longa, mas finalmente acabou.

Com o alvorecer, uma nova vida, um novo caminho se lhe apresentava. Poderia escolher, tinha a liberdade para reconstruir, ou, finalmente, construir, seu futuro. Ele estufou o peito ao mirar-se no espelho. Sorriu para seu reflexo... Reflexo? Mas ele não tinha reflexo. Não passava de uma sombra sem rosto e sem rumo!

Naquela tarde, voltou atrás e pediu perdão. E aceitou com prazer a punição recebida. Agora sim, estava feliz. Feliz como só pode ser quem, no meio de tantos “alguéns”, acovarda-se e aceita a indolente, insolente comodidade de ser sua excelência, o Sr. Ninguém.

Em sua cidade, por ordem superior, nunca mais ventou, e ele morreu feliz... Ou nunca soube o que é a felicidade. Mas é que, Ninguém nunca soube.

Cezar Lopes.

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